segunda-feira, 5 de março de 2012

Estrada Real - Minas Gerais

“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”

Amyr Klink


Em algum lugar...


Nada melhor para inspirar mais uma jornada de conhecimentos que as palavras parafraseadas acima.

E assim começou, rumo ao desconhecido, pelo menos para mim, uma viagem de 8 dias por Minas Gerais com o destino a Serra do Tabuleiro onde se localiza o Parque Estadual da Serra do Intendente que faz parte da grande formação, a Serra do Espinhaço, que pode ser melhor entendida por suas partes. Serra do Cipó, Chapada Diamantina, Serra dos Cristais, Serra de Ouro Branco, Serra Geral são outros trechos popularmente conhecidos. Sim, o Espinhaço são todas estas montanhas, serras, montes, vales reunidos por um mesmo motivo natal: dobramentos geológicos acontecidos no final do período proterozóico, ou seja há mais de 2,5 bilhões de anos.   

Serra do Intendente

E assim fomos eu e Mile, partimos na sexta feira de carnaval as 17:00 com o destino de pernoite aproximadamente para Juiz de Fora, com isto, pretendíamos adiantar a viagem, pois até a cidade de Conceição do Mato Dentro - MG e posteriormente ao distrito do Tabuleiro seriam aproximadamente 900km com alguns trechos de estrada de terra.
A viagem, seria, para mim, um mergulho na cultura e história de Minas Gerais, buscar, no fundo, um resgate as origens, pois minha vinda a este mundo se deu ao pé da Serra da Mantiqueira.  Reviver traços de lembrança da minha infância, buscar sabores já esquecidos, sentir a história da construção do Brasil, uma verdadeira viajem no tempo, onde homens sem liberdade deram suas vidas para a construção de uma das partes mais importantes da nossa cultura brasileira.

Mariana

A intenção da viajem era realizar o trajeto pela região da Estrada Real, nome alusivo a qualquer via terrestre que, à época do Brasil Colônia, era percorrida no processo de povoamento e exploração econômica de seus recursos. Hoje, a Estrada Real abriga em seu caminho a história viva do Brasil, pois seu percurso se estende desde Paraty (estrada velha) e Rio de Janeiro (estrada nova) até Diamantina – MG, passando por cidades históricas como Ouro Preto, palco da inconfidência mineira, Mariana, Tiradentes, São João Del Rei e Congonhas, cidades estas que fariam parte da nossa viagem, e nós, meros alunos de uma época onde a beleza inexplorada de nossas terras se confunde com a truculenta dominação dos bandeirantes.

Acordamos meio ressaqueados do deslocamento de sexta feira, pois véspera de carnaval no Brasil é um frenesi maluco, foram 350 km aproximadamente com muito engarrafamento até pegarmos a BR 040, aí foi tranquilo mesmo chegando umas 22:00 em Juiz de Fora, como dizem os mineiros, quem mora em Juiz de Fora mora de frente para o mar.

Faltavam aproximadamente uns 500 km para o nosso destino, então vamos queimar borracha!!!
Em Conselheiro Lafaiete saímos da BR 040, excelente estrada para rodar, e entramos rumo a Ouro Branco. Começava a viagem que estávamos esperando, pois deixávamos para traz o trânsito de BR e já avistávamos o extremo sul da Serra do Espinhaço ao fundo de Ouro Branco com estrada de interiorrrr sem porrrteira.

De Ouro Branco para Ouro Preto pelo primeiro trecho da Estrada Real, a beleza da transição da mata atlântica para o cerrado já nos fazia desacelerar a motoca e abrir a viseira para sentir um vento nunca sentido, aromas nunca saboreados ao vento.
Estrada real, Tiradentes

 Neste trecho, uma das mais bonitas da viagem, várias pontes construídas no tempo da Estrada Real, preservadas como patrimônio histórico, em uma altitude de mais de 1000 metros, tinham suas cabeceiras enfeitadas por sempre vivas, plantas presentes em mata de altitude, fazendo deste cenário, parada obrigatória para silenciarmos o barulho do motor e relaxar ao barulho do rio murmurante, que a muitos viajantes do passado, suas sedes matavam, e a nós, a sede do belo, um convite a contemplação. Confesso que foi difícil deixar para traz o cenário orquestrado por pássaros, rios e bela paisagem.
Estrada de Ouro Branco para Ouro Preto

Ponte da caveira



Para Ouro Preto


Chegando a Mariana, paramos para dar água aos “cavalos” e tirar o pó da viajem com uma saborosa comida mineira. Avistamos as primeiras manifestações do carnaval mineiro.


Mariana
Céu de Minas
Mariana
Saímos de Mariana e pegamos a MG 129, pois nossos olhos nos levavam a ficar contornando o estremo sul da Serra do Espinhaço, espetacular estrada, vez ou outra cruzávamos um carro, em pleno sábado de carnaval! O pouco trânsito ficava restrito a alguns carros das mineradoras da região. Grandes montes de terra e enormes lagos formados pelo processo de mineração contrastavam com a presença de grandes áreas bem preservadas tornando o sobe e desce embalados pelas curvas e bom asfalto, um passeio saboroso.

Vários km de Serra do Espinhaço a nossa esquerda, passando por Catas Altas, pegamos sentido Barão de Cocais, ficando um gostinho de quero mais, pois para traz ficava a Reserva Ecológica Santuário do Caraça, mas isto é assunto para outro carnaval.





Deslocamento

Saímos na BR 381, sentido Belo Horizonte, mas logo depois pegamos a MG 434 sentido a Itabira até Senhora do Porto onde entramos em uma estrada de terra por 25 km até Dom Joaquim onde já em pôr do sol mais uns 25 km de terra para chegar, em fim, ao nosso destino, Distrito do Tabuleiro, município de Conceição do Mato Dentro.

Chegamos ao albergue do Tabuleiro as 22:00 de sábado e já fomos nos infiltrando no bloco “concentra mas não sai”, algumas cervejas para relaxar o dia rodado e cama, pois os três próximos dias seriam repletos de muitas caminhadas, cachoeiras e um bom sotaque mineiro uai!

Vou deixar as fotos falarem por mim sobre este período em DISTRITO DO TABULEIRO!




Cachoeira Rabo de Cavalo

Distrito do Tabuleiro

Parque Estadual Serra do Intendente

Rumo a Cachoeira Rabo de Cavalo


O próprio
Rio Preto

Cachoeira do Tabuleiro

Cachoeira Rabo de Cavalo

Não é um cavalo...é uma mula. O Brasil foi feito no casco deste animal.

Até aí 4 km de pura subida, olha a seta...mais subida.

Um arranjo de flores!




Uma raridade, àgua pura e cristalina !!!

Leito do rio que forma a cachoeira do Tabuleiro, parte de cima.

Caminhada pesada a parte de cima da cachoeira.

Parte alta da cachoeira do Tabuleiro


Cachoeira Congonhas

Cachoeira do Tabuleiro
A estadia em Tabuleiro foi no www.tabuleiroecohostel.com.br e apesar das opções de hospedagem serem poucas, a qualidade do hostel é muito boa, com área para camping além de suítes muito confortáveis e aconchegantes. Para almoço recomendamos o Rupestre que além da boa e simples comida mineira, os PF`s são feitos com um toque de bom gosto, decoração a parte.

Três dias de Tabuleiro nos renderam lembranças para toda a vida, uma região que vale a pena voltar, principalmente pela travessia Lapinha-Tabuleiro, uma das travessias mais bonitas do Brasil.

Quarta feira de cinzas. Acordamos de madrugada rumo a Tiradentes, pois não gostaríamos de pegar o fluxo das pessoas chegando a BH. A região da Serra do Cipó é a primeira parada pra que vem de BH e em feriados fica abarrotada de pessoas. Como iríamos passar por lá, acordamos o galo para cantar.

Descemos a Serra do Cipó, mais ao sul de onde estávamos logo pela manhã, passando por BH, sem problemas de congestionamentos.

 Parada obrigatória em Congonhas para ver as obras de Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho e logo que paramos a moto, nos aborda um guia para nos contar a história das obras, no momento não aceitei a idéia de ser “guiado”, mas Mile comentou que poderia ser interessante. E foi. Para nós e para o guia.



Nós fizemos a visita aos Passos da Paixão e Os Doze Profetas, da Igreja de Bom Jesus de Matosinhos. Os trabalhos artísticos formado por 66 imagens religiosas esculpidas em madeira e 12 feitas de pedra-sabão estão dispostas em seis capelas especialmente construídas para as obras e conforme íamos parando em frente das capelas, nosso guia falava sobre detalhes imperceptíveis, pelo menos para os leigos sobre a vida e as obras de Aleijadinho.
Éramos guiados a perceber os traços deixados pelo artista, traços de sua enfermidade e o sofrimento como a doença, pois, nesta altura, já era perceptível os traços de uma consciência política da época. Aleijadinho foi um artista inconfidente.



Após a visita, comentei com o guia que sua voz repercutia dentro das capelas, um suave eco nos envolvendo de uma forma que viajávamos na história e nos fazia voltar ao passado. Isto fazia de seu trabalho algo especial, como em uma hipnose.
O guia ficou surpreso com o comentário, pois em 38 anos trabalho entre as capelas, não sabia que sua narrativa ecoava pelas obras, como se as esculturas estivessem falando a nós.

A não ser que você realmente conheça a história de Minas, um guia torna o a visita muito mais enriquecedora.


Aleijadinho, em suas estátuas em frente da igreja, reproduziu os rostos dos inconfidentes.



























E seu auto retrato também
Chegamos a Tiradentes logo no início da tarde e procurar hotel nas ruas de pedra de Tiradentes, com a motoca carregada foi bem difícil, pois nossos corpos ainda estavam cansados das trilhas pelos sertões de Minas.
 www.villaallegra.com.br  foi o hotel escolhido, confortável, sofisticado, familiar, mas cheio de personalidade, para quem quer o silêncio da serra de São José, ao fundo da pousada, esta é a pedida.



Hotel Vila Allegra

Em Tiradentes, permanecemos três dias e durante este período, fomos a São João Del Rei e Bichinho, um distrito de Prado, município vizinho de Tiradentes e reduto de muitos artesões que exportam seus trabalhos para todo o Brasil. Como estávamos visitando logo após o carnaval, a maioria dos ateliês estavam fechados, descanso merecido.

Outro achado foi a Estrada Parque que liga Tiradentes a Prado, pela estrada que leva a Bichinho, uma estrada que foi transformada em um refúgio da vida silvestre por um Decreto Estadual, um passeio imperdível de aproximadamente 10 km dentro da mata que pode ser feito a pé, de carro ou de moto. Para chegara a Estrada Parque basta seguir a estrada Real que liga Tiradentes a Bichinho.

Tiradentes tranquila...




Serra de São José, ao fundo da moto, no horizonte, Tiradentes.
Leve menos roupa, acredite, vc vai querer deixar algo para traz..

Tiradentes

Tiradentes estava muito tranquila depois do carnaval

Restaurante Pau de Angu, caminho da estrada Real, Tiradentes a Bichinho.

Em Bichinhos

Estrada Parque

Estrada Real, ao fundo a Estrada Parque


Tiradentes conseguiu preservar sua história sem interferência das construções modernas


Estrada de Tiradentes a Bichinho


A fonte é alimentada por um aqueduto construida por escravos, vale a caminhada pelo aqueduto.

Tranquilidade, descanso na soleira garantido.

A caminho da igreja da Santíssima Trindade



sky, blue sky



O busto de Tiradentes serviu como tripé para esta foto




São João del Rei...

Igreja de São Francisco

Igreja de São Francisco. Projeto da fachada de Aleijadinho

Tinha acabado de chover...

Igreja N.S. das Mercês

Torre da Igreja N.S. do Carmo

Casa da família Neves
Foram oito dias de Minas, escolhemos duas regiões distintas para visitar, mas a impressão que ficou é que Minas é muito maior que nossa história e muitos carnavais serão precisos para se tirar 10 nesta matéria. Minas impressiona por suas boas estradas, mesmo as menos movimentadas e pela receptividade. A Serra do Espinhaço vai render muitas viagens a Minas, pois em minha opinião, as belezas naturais de Minas como cachoeiras, cerrado, mata atlântica, são realmente, as principais atrações deste Estado maravilhoso.